Civilização, Patrimônio Histórico, Banco Central e Mágica Monetária
Um problema: a conservação do patrimônio histórico. Uma pseudo-solução: a proteção de organizações governamentais.
É onipresente a tentativa dos modernos de chutar para o Estado a responsabilidade sobre toda sorte de problema social complicado ou cuja solução ninguém consiga conceber exatamente. “Quem vai cuidar dos pobres? Hmm.. não sei, o Estado!” ou “Quem vai construir as estradas? Também não sei. O Estado!” e “Quem vai proteger o patrimônio histórico cultural?” Não será o Estado. Ou há incentivos para que as pessoas se preocupem o suficiente com bens históricos a ponto de preservá-los, ou ninguém vai preservá-los, muito menos o Estado, que também é feito de gente, por sinal.
Aliás, é o próprio Estado moderno que desfaz assiduamente, desde 1913, os incentivos para tanto, com o que talvez seja o advento da pior instituição criada pela civilização humana: o Banco Central.
Taxa de Juros
A taxa de juros, que o banco central controla, não é uma mera medida financeira, que interfere aqui e ali na vida dos investidores e dos consumidores, ela é uma medida civilizacional da mais alta importância, que expressa o quão desenvolvida e estável é uma sociedade em comparação a outra.
Como esse numerosinho pode ser tão importante. Muito simples, o juro, qualquer juro, é uma medida de preferência temporal. O que isso quer dizer? Quer dizer que quem empresta prefere o futuro ao presente.
- Se eu te empresto R$ 100 pra você me pagar 110 daqui a um ano, quer dizer que eu prefiro R$ 110 num ano do que R$ 100 agora.
- Se eu te empresto pra você me pagar só 101 daqui a um ano, quer dizer que eu prefiro 101 reais daqui a um ano do que 100 reais agora.
Quanto menor for o juro pelo qual as pessoas emprestam, menor é a preferência temporal delas. Isso quer dizer que elas preferem os bens presentes só um pouquinho a mais do que os bens futuros. Se a taxa de juros é alta, significa que as pessoas preferem muito mais os bens presentes do que os bens futuros.
Como a taxa de juros afeta a sociedade?
Mas como isso pode se refletir no caráter civilizacional de uma sociedade? Ora, se essa expressão daquilo que a sociedade prefere tende mais para o presente, quer dizer que as preocupações das pessoas são mais imediatas. As pessoas pedem dinheiro emprestado para comprar bens de consumo, bens que vão ser usados o quanto antes. As pessoas estão comprando TV’s, carros, pizza e coisas do tipo, tudo isso, porque é mais barato.
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Se essa medida se expressa pela taxa mais baixa da taxa de juros, as pessoas começam a investir seus recursos, para desfrutarem dele só no futuro. As pessoas compram máquinas para fazer prédios, para construir uma sede de uma indústria, ou para fazer um investimento que só vai se pagar em muitos anos. Ora, tudo isso demora, e vale mais a pena quanto menor for o valor do tempo durante o qual se emprega esse dinheiro. Se o valor desse dinheiro é caro, se a taxa de juros é alta, as pessoas fazem menos esse tipo de investimento.
Patrimônio Histórico
Mas e como isso poderia ter a ver com a conservação do patrimônio histórico cultural? Bem, essa taxa, como já foi dito, revela a preocupação temporal das pessoas. Conservar, seja lá o que for, é uma preocupação para com o futuro, seja a conservação de uma herança em dinheiro, seja a conservação de uma casa, seja a conservação de um quadro raro.
A preocupação com os bens históricos é a preocupação que se tem com os seres humanos do futuro, para que eles os conheçam e possam apreciá-los. É uma preocupação com as próximas gerações.
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Ora, essa disposição a preocupar-se com o futuro é uma disposição que surge somente depois que as pessoas já resolveram suas necessidades mais imediatas, de subsistência, de se alimentar, de dormir, de trabalhar para prover o próprio sustento etc.
Essa disposição surge com a abundância. Quando as pessoas já estão bem alimentadas, descansadas e ricas. Quando as poupanças estão cheias. Ocorre que, quando as poupanças estiverem cheias, há uma maior concorrência entre os credores para emprestarem dinheiro, aí o crédito fica mais barato, e a taxa de juros cai.
A taxa de juros cai como um reflexo da preocupação com o futuro, portanto.
Banco Central
Esse é o processo natural e espontâneo do progresso civilizacional. É no meio dessa história toda que entra o Banco Central. E tudo muda com o Banco Central. Observe que, até agora, tratou-se a taxa de juros como um efeito, como um reflexo, como um resultado do crescimento e do progresso. A política monetária do banco central é o mais pernicioso possível da confusão entre causa e efeito.
Tomando o juro não mais como efeito desse progresso, o banco central investe na redução artificial desse número para que ele dê causa ao progresso.
O Banco Central permite que os bancos tenham em posse mais dinheiro do que os seus respectivos clientes investem em suas poupanças, de modo que esses bancos, dispondo de mais dinheiro em caixa, possam emprestar dinheiro a taxas menores do que elas seriam de outra forma.
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Com os juros mais baixos, as pessoas fazem aqueles mesmos investimentos que elas fariam se este mesmo número estivesse mais baixo como efeito do progresso, ou seja, elas fazem investimentos de longo prazo. As pessoas constroem prédios, compram máquinas complexas para a produção industrial, montam empresas que só vão render depois de anos etc. Mas tudo isso sem o respaldo da demanda real por essas coisas. Como assim?
Ora, se as pessoas estão colocando mais dinheiro nos bancos, poupando mais, elas fazem isso porque têm mais dinheiro. As pessoas têm que lidar com suas necessidades mais primárias. Só depois de sobrar dinheiro dessas necessidades é que as pessoas podem estocá-lo. Ora, quando a taxa de juros diminui como efeito dessa estocagem, significa que as pessoas estão mais ricas, significa que há mais demanda para muitas coisas, que, aí sim, têm um respaldo fático para serem construídas, um respaldo social verificável por meio desse número.
Mágica Monetária
Já quando esse número da taxa de juro cai como efeito não dessa estocagem de dinheiro espontânea, como efeito da riqueza, mas cai como efeito de um artifício, da multiplicação mágica de cédulas dentro de um banco, a demanda não passa magicamente a existir. Daí todos esses investimentos de longo prazo, ou de qualquer sorte, serem feitos em maior quantidade, mas sem a demanda real, por trás, para consumi-los.
Estes investimentos quebram. E quando quebram, quebram um atrás do outro, numa cadeia violenta mais conhecida como crise financeira, ou bust. Esse bust, como explicado, é efeito de um boom anterior causado pela multiplicação mágica do dinheiro na conta dos bancos.
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Agora você imagina esse fenômeno de manipulação arbitrária e artificiosa desse número crucial de uma civilização sendo feita cotidianamente (mais precisamente, de três em três meses, com a reunião do Comitê de Política Monetária). Essa manipulação chacina todo ideal civilizatório, mata toda preocupação que se possa ter com as gerações futuras, incluindo aí o respeito das pessoas pelas artes, pela alta cultura e pelo patrimônio histórico.
Isso ocorre porque as pessoas, majoritariamente, nunca estão conseguindo suprimir, de forma duradoura, suas necessidades mais básicas, porque estão sendo sempre enganadas pela manipulação desse número.
Pessoas preservam o patrimônio histórico, não uma entidade mágica chamada IPHAN. Tire o Banco Central da jogada e as pessoas preservarão o patrimônio histórico. Com ele na jogada, nem tem mágica que dê jeito.